Supermercado II

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Sempre me divirto com a criatividade dos aplicativos de relacionamento. Existem aplicativos para achar namorado, ficante, parceiro sexual. Existem até aplicativos para quem gosta de homem barbudo, por exemplo. Dia desses eu descobri um aplicativo no qual a mulher é tratada como cliente e o homem como mercadoria. Os homens estão em ligeira desvantagem. As mulheres podem mandar mensagens sem a concordância dos homens. Eles não.

Na primeira impressão parece que os homens realmente são apresentados como mercadorias – ou como candidatos a emprego. As clientes têm uma lista de compras na qual podem especificar itens que procuram num determinado produto. Dá escolher cor de cabelo, homem que goste de cozinhar, que entenda de mecânica, que saiba dançar (item opcional de poucos modelos, infelizmente). Mas continua ainda sendo um supermercado desorganizado. https://lucampos202.wordpress.com/2015/09/24/supermercado/ De cara, já sabia com o que encabeçaria minha lista. Tem que ser bem humorado. Não consigo gostar de um homem se não consigo rir com ele. De preferência, deve gostar das minhas piadas, mesmo as sem graça.

Cadastro feito, comecei a navegação. ”Fulano lhe enviou solicitação de contato.” Eu poderia aceitar ou não para ver o que acontecia. Aceitando, o chat de abriu pra conversa. Desclassifiquei o candidato logo depois. Impaciente demais por um primeiro encontro. Não gosto disso, pode até ser perigoso. Há quem mergulhe de cabeça no papel de homem-objeto, O perfil mais divertido que eu li foi um em que o indivíduo se apresentava como um carro 78, quase sem uso, praticamente única dona.

Criatividade à parte, o cara pode se definir como freelancer (pega mais não se apega), estagiário (pra ver no que dá) e carteira assinada (quer romance).  Na verdade quase todo mundo é freelancer. Me diverti um bocado com um sujeito que se apresentou como freelancer e disponível para adoção. Depois de dizer que não queria papo, ele tentou me convencer que eu não tinha entendido direito a proposta. Lá pelas tantas ele perdeu a paciência e me disse que o que ele realmente queria uma mulher disponível (agenda livre pra ele, sem restrições), geograficamente próxima (o que era o caso) e que nunca em momento algum reclamasse ou cobrasse nada. Sugeri uma boneca inflável.

Aí me dei conta que poderia pedir reserva da mercadoria. Reserva, na bucha. O serumano que aceita reserva não consegue conversar com outra mulher no chat do aplicativo durante 24 horas. Eu teria exclusividade na entrevista. Em se tratando do mundo virtual, 24 horas é quase a eternidade, principalmente num sábado. Eu, se  fosse homem, não aceitaria reserva. Ou talvez aceitasse, é o tipo da coisa que pode aumentar a popularidade.

Ato contínuo, me dei conta que o aplicativo me mostrava as rivais. Hã? Deu vontade de sair correndo. Em seguida lembrei de uma amiga que conversava com um boy americano. Um dia ela descobriu que ele também conversava com a prima dela. O sobrenome das duas não deixava dúvidas, ele sabia disso. As rivais estão ali só pra evitar que duas amigas conversem com o mesmo cara. Às vezes o mundo virtual parece assustadoramente pequeno. A gente encontra pessoas que conhece no mundo real. E às vezes, pessoas que a gente conhece bem. Encontrar um colega de trabalho num aplicativo desses é esquisito, muito esquisito. Ao menos eu acho.
Os homens são tratados como mercadoria, mas as mulheres também. Eles também fazem uma lista de compras no seu perfil, com os opcionais desejados. Dá pra procurar por cor do cabelo, tamanho, tipo de corpo, estilo e uma série de outros opcionais – alguns bem ousados, inclusive – bem mais ousados que os opcionais masculinos, que incluem um inocente cueca boxer como opcional de fábrica.
No fundo mesmo o jogo é sempre o mesmo, só é mais bem humorado. Os aplicativos tem regras exclusivas do mundo virtual e mais aquelas do mundo real. O mais impressionante é que tem gente que não se dá conta. E se irrita, xinga, faz o diabo. A proteção da tela do computador não aumenta as chances de conhecer alguém que não daria bola pra gente na vida real. E essa regra é clara, não importa onde a gente esteja jogando o jogo da aproximação.


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